segunda-feira, 2 de março de 2015

Revisão por pares

Não sei se é possível traduzir por “revisão por pares” a expressão em língua inglesa “peer review”. Para quem não sabe explico aqui rapidamente. Este processo, conhecido por revisão por pares (para todos os efeitos vou usar a expressão portuguesa), é o mais utilizado ao nível académico para aceitação de artigos. O autor submete o seu artigo a uma revista da especialidade. O artigo é anonimizado e depois é avaliado por especialistas da área que o aprovam ou rejeitam. Procura-se, deste modo, garantir rigor nas publicações e nas descobertas propostas pelos autores dos artigos. Como seria de esperar também este método de avaliação de artigos falha. E não falha somente em áreas como a filosofia. Em termos proporcionais, falha até muito mais em ciências como a matemática ou a física. É isso mesmo que nos revela Jorge Buescu no primeiro capítulo de Primos Gémeos, Triângulos Curvos e Outras Histórias da Matemática (Gradiva, 2014). O processo atinge dimensões astronómicas quando surgiu a internet. A internet democratiza o conhecimento, pois hoje em dia até numa universidade pobre se tem acesso aos melhores artigos científicos e filosóficos da atualidade. E com a expansão da internet os artigos passaram a estar disponíveis em modelo Open Access. Este modelo permite que os artigos estejam disponíveis de forma gratuita para que todos, mesmo aqueles que menos dinheiro têm, possam acedê-los. O problema é que alguém tem de os pagar. Então quem os paga? Os autores ou as instituições que os representam. Um autor para publicar um artigo numa revista da especialidade pode chegar a pagar milhares de euros. Repare-se que são especialistas que vão ter de ler aturadamente o artigo. O reverso do modelo são as revistas predadoras que procuram apenas extorquir dinheiro aos autores.
O mais interessante em todo este processo é que na filosofia as coisas não são diferentes do que se passa, por exemplo, na matemática. As revistas predadoras de OA abriram portas a toneladas de artigos que não passa de lixo científico. E isto na matemática. Ou seja, onde pensamos que o crivo do rigor é exímio é ao mesmo tempo onde há mais charlatanice. Dá que pensar?

Jorge Buescu é um matemático português e com vários livros publicados entre os quais parte são de divulgação científica. 
O filósofo inglês Nigel Warburton defende neste pequeno texto que é preferível um editor competente a um peer review incompetente. Não me parece de todo convincente pois num caso e no outro (editor ou peer review) o que se pretende é a competência e charlatanice na era da internet é coisa que não falta pelos mais variados motivos sendo que os ligados ao lucro fácil são aqueles que alcançam maior expressão. 
Em Portugal a publicação em filosofia com maior expressão em sistema de OA é a Disputatio, International Journal of Philosophy, publicada pelo LanCog

Um dos testes interessantes a aplicar nestas revistas em sistema OA é replicar o caso Bricmont, Sokal, tão bem exposto em Imposturas Intelectuais. Consiste em enviar textos para estas revistas, com erros grosseiros propositados e sujeitá-los à avaliação por pares. Jorge Buescu retrata bem esta situação e experiência no livro. 

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